sexta-feira, 21 de setembro de 2007

Censura!


Vivemos em uma democracia. Até que ponto? Erroneamente achamos que o período ditatorial a pouco vivido está superado, mas não é bem assim. Um exemplo é a censura. Claro que os meios mudaram, na ditadura militar era uma política de governo, que impunha aos meios de comunicação (pelo menos a aqueles poucos que eram contrários ao regime) as informações e pontos de vista que eram passados para a sociedade, privando (dificultando) essa de formar sua opinião. Hoje ainda existe a censura, embora com os mesmos objetivos usando outra lógica. Os meios de comunicação (a maioria) trazem (ou escondem, depende do interesse) informações tendenciosas, contrárias ao governo, e com objetivo de manipular a população. Quando uma ferramenta que não é a mídia opta pela formação e informação ela não se contém: censura.

Essa reflexão, que pode ser generalizada, tem um fato específico. No jornal O Globo de 18/09/2007 o jornalista e diretor executivo da Rede Globo Ali Kamel escreve um artigo questionando o livro didático Nova História Crítica, da editora Nova Geração e de autoria do historiador Mário Schmidt. Questiona não, censura. Qualificando como “ridículo manual de catecismo marxista” Kamel além de ignorar o conteúdo da obra a desqualifica. Usa um dos meios de comunicação de mais abrangência do país para fazer uma campanha explícita contra o livro. Isso porque a obra não é mais um manual de história conservador, segue o caminho oposto, tenta trazer sempre o aluno a reflexão e aborda diferentes pontos de vista.


Nova História Crítica é amplamente adotado na 8ª série do ensino fundamental. Os professores, com a autonomia que tem, reivindicaram ao MEC que o livro fosse um dos que o ministério disponibilizasse aos alunos. Além de conspirar contra a editora e o autor do livro, Ali Kamel desrespeita a soberania e autonomia dos profissionais da educação. Querendo que o catecismo fosse em outro rumo assina um atestado de arrogância ao achar ser superior aos demais, interferindo diretamente em assuntos que não são de sua competência.


Aliás, mesmo os que deveriam ser de sua alçada não desempenha com louvor, muito pelo contrário, não tem escrúpulos, ética e comprometimento com a verdade. Quem não se lembra de seu artigo racista contra as cotas em universidades? Conheço algumas pessoas contrárias as cotas, apesar de ser totalmente a favor não questiono (nesse momento) os méritos, e sim os argumentos. A versão mais moderna da censura brasileira usa a credibilidade (totalmente questionável) de um grande jornal para desqualificar um livro didático. Uma lógica minuciosamente elaborada, que pega a base do problema. Afinal são os mesmos alunos de 8ª série que estudam com um livro que questiona e propõem a crítica que no futuro próximo serão os leitores dos jornais. Tendo uma boa formação em sua base não serão expectadores passivos de uma imprensa rancorosa, covarde e golpista como a de hoje. Terão todas as condições de tirar suas próprias conclusões, princípio inaceitável a censura. Sabendo disso a direita não tem dúvida, corta pela raiz. Leva-nos a crer que gostaram da experiência, quem ontem foi censurado censura hoje.


A nota da editora Nova Geração e do historiador Mário Schmidt que comenta o artigo de Kamel foi publicada no sítio do PT. Para ler na íntegra clique aqui.

8 comentários:

Anônimo disse...

Não tem muito a ver com a Censura, mas para os interessados em História, a historiadora Mary Del Priore estará em Belo Horizonte segunda-feira, 01/10, ás 19:30 no Palácio das Artes para o "Sempre um Papo",
quem quiser saber mais é só estrar:
http://www.sempreumpapo.com.br/agenda

Jayme Neto disse...

Sobre a Nova História Crítica: é um livro que eu tomaria muito cuidado, pois é totalmente parcial e não concordo com o modo em que Mário Schmidt leva as leituras de alguns temas. Por outro lado, ele inova com uma linguagem mais simples e reflexiva. Mas, é preciso lembrar que a grande parte dos livros didáticos lançados após o período da ditadura são de orientações marxista, sendo que a maioria dos autores desses livros são oriundos da USP.

Jayme Neto.

Sávio disse...

Qual livro não é parcial??? Temos que escolher o que é parcial de acordo com o que voce acredita. O professor tambem é parcial. Ainda bem.

Jayme disse...

Concordo que todos nós somos parciais e todas as obras são parciais. No entanto, o modo no qual utilizamos das palavras que deve ter cuidados. E nesse livro de Mário Schimidt, o marxismo é exposto como fonte de verdade, basta ver as iconografias usadas por ele. Assim, utilizar desse mecanismo para levar a história para crianças de até 15 anos que dificilmente conseguem abstrair e diferenciar o que está escrito, se torna um processo perigoso.
Porque além do marxismo, à muitas outras formas de interpretações a fazer da história, através da escola dos Annales, Weberiana, Durkheimniana. Nesse sentido, o professor precisará ir além do livro didático para sintonizar o aluno no processo de aprendizagem.

No mais, queria ler o que Ali Kamel escreveu sobre o livro, pois a análise que fiz deste livro foi pessoal.

Sávio disse...

Nunca teremos obras perfeitas nem professores perfeitos. O que devemos ser é profissionais e acima de tudo honesto. No caso do professor ser honesto é explicitar sua parcialidade, mostrar sem mascaras o que ele acha. Ser profissional no âmbito de aceitar e respeitar as opiniões divergentes, nunca sendo autoritário. A história como verdade todas essas correntes tentam passar. O marxismo por ser mais complexo e abrangente tem a sua filosofia da história. É uma historia militante. Acho que um livro como esse ajuda justamente as crianças a abstrair e diferenciar, mas não só o que está escrito, mas a sociedade como um todo. Não existindo formula perfeita uma obra que estimula a crítica e o questionamento, a meu ver, é muito bem vinda.

Jayme disse...

Caro Sávio, concordo com tudo o que você falou aqui nos comentários. Mas, a minha indignação é com o livro do Mário Schmidt. Porque o marxismo contribuiu e tem muito mais a contribuir para a História e as Ciências Humanas.
Agora, penso que a editora e o próprio Mário devem estar muito putos com Ali Kamel porque sua influência fez que eles perdessem todo o lucro proporcionado pela venda dos livros ao MEC. Assim, Mário entra numa contradição, pois se trata de uma elite da empresa editorial no Brasil e denuncia as elites e o capitalismo nessas obras. E será que no Socialismo, eles ganhariam tanto dinheiro como ganham em cima do governo brasileiro.
E mais, o professor Ângelo do departamento de História da UFV falou que o Mário nem Historiador formado é e que o preço do livro para o Governo é mais caro do que para a iniciativa privada.


E procurei além do texto de Ali Kamel um outro blog:

blog.estadao.com.br/blog/guterman/?title=historia_engodo_e_irresponsabilidade_pub&more=1&c=1&tb=1&pb=1#comments

Sávio disse...

Claro que a questao financeira pesa. Agora se um livro marxista nao ganhar dinheiro necessariamente abrira espaço para uma outra abordagem ganhar, afinal o mesrcado tai. Nao conheço, pessoalmente o Mário, acredito que vc tambem nao, ja passou por sua cabeça que alem de estar puto pelo grana, e deve estar mesmo, ele pode ta puto porque uma obra sua, um trabalhoso ardoroso, sofreu censura? Que sua ideologia foi ferida? Que um jornalista tosco conseguiu diminuir o trabalho e estudo de anos? Que os meios de comunicaçao que nao sao nada democraticos tenham este peso todo? Nao consigo conceber toda sua revolta só pelo dinheiro, apesar de nao conhece-lo. Pense nisso.

Jayme disse...

Sávio, você já analisou o livro do Mário em partes, leu os capítulos?
Eu já dei algumas aulas o lendo, mas acho que ele faz mais do que passar a produção da história.
Analise as iconografias do livro, aquilo é panfletarismo puro e não história. E assim, como você disse que tem um trabalho árduo de fazer um livro. Esses argumentos viram verdades para os alunos. Dessa forma, corre o risco dele desqualificar vários trabalhos de diversos historiadores.
Quando ele questiona os fatos é algo brilhante, faz o aluno pensar e trabalhar com as incertezas em torno da História.
Mas, você falou que um jornalista tem poder de acabar com o seu trabalho. No entanto, porque o governo aceitou as críticas e não abriu o espaço para a editora nova geração e Mário se defenderem, pois quem tomou a medida de não comprar mais os livros foi o governo e não a globo. Será que nosso governo não teve uma atitude frouxa?
E teorias marxistas estão impregnada em muitos livros didático, pois grande parte são feitas por pessoas formadas na USP e UNICAMP, sendo grande maioria influenciados por Caio Prado Jr (marxista), que é um excelente pesquisador.
E uma comparação, de uma olhada no livro que é utilizado no COLUNI de duas historiadoras formadas na UFMG - Myriam Becho Mota e Patrícia Ramos Braick-, acredito ser um trabalho mais sério e mais responsável.
Esse debate está legal, pois primeira vez que converso isso com alguém que já teve experiência dentro da sala de aula.