quarta-feira, 19 de setembro de 2007

Notícias de uma guerra pública


"Homem de preto, qual é sua missão?
Entrar pela favela e deixar corpo no chão.
Homem de preto, o que é que você faz?
Eu faço coisas que assustam o satanás

(Coro cantado pelos policiais do filme. De ficção)

O site oficial do novo filme de José Padilha, Tropa de Elite, anúncia a estréia nos cinemas no dia 12 de outubro. No entanto uma versão do longa já foi massivamente divulgada através de pirataria e internet. O caso chama a atenção particularmente pela pirataria ter sido acompanhada de seqüestro da equipe produtora e roubo das cenas, ainda não editadas, o que sustenta a tese de que o filme que está em circulação não teria sido finalizado e não seria, portanto, a versão “oficial”.

Pano pra manga, só este parágrafo nos dá pelo menos uma meia dúzia de assuntos polêmicos a serem seriamente debatidos. Isso porque ainda não chegamos ao conteúdo do roteiro. E é justamente sobre ao que o filme fala que vou me prender, a meia dúzia fica pra próxima.

Tropa de Elite (a edição disponível) expõe – através do drama pessoal de um comandante do Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar do Rio de Janeiro (BOPE) que quer deixar o cargo, dentre outras coisas pela paternidade, e precisa, para tanto, preparar um substituto a altura – a complexa trama que se estabelece entre PM, BOPE, traficantes, sociedade “do morro” e sociedade “do asfalto” quando uma situação de extrema desigualdade social como a brasileira desemboca em quadros de violência e narcotráfico como no Rio de Janeiro.

O diretor afirma, segundo o site da Globo, não ter gostado da edição disponível. Penso que se Padilha conseguir mostrar mais do que já foi visto terá em mãos uma grande obra. Só o material que já está circulando já merece os parabéns. Tanto os produtores, como os editores, sejam eles quem for.

O filme é denso, aborda diversos pontos e provoca o tempo todo. Fala de violência, corrupção e tortura em instâncias muito mais próximas e cotidianas que costuma-se falar, de modo que incomoda uma sociedade que está acostumada a só se incomodar quando o problema bate à sua porta. E verdadeiramente, o problema está em nossas portas.

Faz perguntas que geralmente não são feitas e que por isso não se chega a respostas. Mas, mais que isso, mostra que mesmo quando nos perguntamos e buscamos estas respostas, esse caminho já não é tão fácil ou tão curto. Sem caricaturizações ou sensacionalismo, o filme tenta passar que o problema é extremamente complexo e delicado.

Assistam. Recomendo. Se não gostarem do filme, que pelo menos desgostem da realidade em que ele se baseia.

7 comentários:

N. Real disse...

Vai sair no Brasil todo?
Duvido que entrará em cartaz em algum cinema aqui em BH.

Gente,
ajudem-me... como faz pra dar enter entre os parágrafos?
não consigo.
de forma alguma.

bejios!

Anônimo disse...

Outra coisa: parabéns Nilo, o texto está muito bem escrito...
Vocês vão longe, rapazes!

Natália.

nilo disse...

brigado, tamos treinando pra chega ao nível da "Diaba".

A edição, que deve estar sendo exibida esta noite só para convidados no festival de cinema do Rio, pelo que estão divulgando na internet, parece ter sofrido mesmo algumas alterações. Alguns cortes e cenas acrescidas que somam uns 5 minutos a mais de filme, além alterações na montagem e na narração.

Jayme Neto disse...

Parabéns Nilo, o texto está bem escrito.
Enquanto o filme, achei sensacional, pois não possui uma carga emotiva, mas muito reflexiva. Primeiro, a questão do tráfico: o viciado não pode ser totalmente culpado pelos problemas ocasionados pelo tráfico. No entanto, podem ser considerados cúmplices, porque financiam essa merda instaurada nas grandes cidades do país e em Viçosa...
Segundo: Muitos criticam a forma no qual o BOPE é conduzida, porém com a visão que o filme nos passa, é visto que, essa organização não compreende em viver para matar bandido, por mais que falem isso nos refrões de guerra, mas são altamente treinados para resolver os problemas quando o "bicho" tá pegando.
E como o autor do texto colocou ao final, é importante assistir ao filme para situarmos dentro da complexa sociedade em que vivemos. Assim, todos devem pensar sobre a função que exercem dentro dela.

Mais uma vez, parabéns Nilo pela iniciativa também...

Sávio disse...

Não vi o filme. Mas depois leiam o artigo do PHM "Tropa de Elite é "F" de Farsa". Ta no Conversa Afiada (tem o link no blog). Vai em direçao oposta as opinioes aqui do blog.

nilo disse...

Gosto muito do tom irônico que o PHA adota no seu blog e respeito muito suas opiniões.
Mas não vejo o filme trazendo questões fechadas, como na leitura feita no Conversa Afiada.
Não vejo levantar a bandeira da vilência, da corrupção, da tortura, do pessimismo ou do entreguismo.
Não vejo filme fazendo caricaturas de personagens do sociedade brasileira. Não vejo, como vê PH, o "mocinho" e o "vilão". Vejo o recorte do diretor um pouco mais complexo.
Me parece que questões foram levantadas, soluções não.
Mas como disse, vejam. E compartilhem suas conclusões.

Jayme Neto disse...

Interessante esse blog que o Sávio indicou, mas não concordo com grande parte das afirmativas que ele coloca em questão. Por que?
Como experiência de vida em Niterói e o que pude ver no filme, os playboys sobem o morro pra comprar drogas e venderem depois aos seus amigos. Tanto, que eu tenho um amigo que fazia isso, e também me falou que o colégio onde há o maior índice de pessoas da classe alta, 90% dos alunos fumavam maconha. Assim, um ponto positivo pro filme.
Sou contra o confronto de policiais e bandidos na favela, pois grande parte dos moradores são pessoas dignas, porém acontece e pela representação do filme, o BOPE sobe para operações especiais como resgatar policiais feridos e quando há eventos perto da favela, como a visita do Papa.
E enquanto a lavagem cerebral que há no treinamento do BOPE, pelo menos o filme nos mostra que os corruptos são os primeiros a desistirem, pois um ideal do BOPE é de que as pessoas não devem levar vantagem em cima das outras (naturalidade brasileira), pois precisam da ajuda de cada membro para o grupo ter sua eficiência.
No mais, não acho que deveria ter o BOPE, mas nas circunstâncias em que nosso país se encontra e principalmente o Rio, eles aparecem como uma ação afirmativa.
E contradizendo ao autor do blog do "conversa afiada", vivemos em muitas circunstâncias numa sociedade sem lei, basta perguntas aos conterrâneos de Viçosa que já foram assaltados, como foi o tratamento feitos pelos assaltantes.